Choveu no último dia.
As nuvens a dissolverem-se sobre as nossas cabeças e o metro fechado.
Choveu, como as lágrimas que chorámos em cima da roupa atirada à pressa para dentro da mala. Os beijos, os olhares, as promessas, os corpos sôfregos de união e o tempo obstinado a separá-los.
O amor a adiar a despedida.
A água escorria pela tua mão pousada na superfície seca do vidro da janela. O desespero impotente de um gesto perante o espaço e o tempo. O teu corpo a esmorecer à medida que o teu olhar focava cada vez mais longe o farrapo que eu era.
Eu, um miserável apêndice de uma mala de viagem.
A mirrar. Um balão atado por uma criança ao ferro da cama, e esquecido. Eu era esse balão, aquilo que existia para além de nós, era a criança.
O espaço em mim a consumir-se e a sua superfície a enrugar.
A cidade uma última vez e as nuvens. A tua sombra distendida pelo soalho em frente à janela.
Na cabeça, os beijos, os olhares, as promessas… As palavras inconcebíveis.
E o tempo e o espaço, e o universo para além de nós.
Implacáveis.